Desde
 que me lembro que a escola faz parte da minha vida. Com três anos de 
diferença do meu irmão, mais velho, lembro-me de querer sempre 
acompanhá-lo nos trabalho. Sou do tempo em que não havia jardim de 
infância e as crianças ficavam com a família, até à idade escolar. 
A
 minha mãe conta que comprou um caderno só para mim e que eu imitava 
aquilo que o mano fazia. A verdadeira "macaquinha de imitação".
Quando
 entrei na escola já sabia algumas coisas. Nunca houve pressa para me 
ensinar nada, cá em casa. Mas eu via e aprendia com o mano, de forma 
natural. Ir para a escola era algo que eu aguardava muito. Ia ser a 
minha vez de trazer trabalhos para casa. Foi uma aventura. E um 
desalento. 
Não
 compreendia por que é que os meninos demoravam tanto tempo a aprender 
as coisas. "Tantos dias para aprender o a!" - eram coisas destas que a 
minha mãe ouvia, quando eu chegava. Tive que aprender a esperar (algo 
que ainda hoje estou a aprender, confesso). E tinha um caderno cá em 
casa, só para casa, para treinar coisas que eu já sabia e que os meus 
colegas ainda não tinham aprendido. É que o mano continuava a estudar, 
uns anos "mais à frente" e eu, curiosa como sou, não resistia a 
acompanhá-lo nos estudos. E a professora não gostava muito que eu 
avançasse nas coisas. Eu avançava, sim, mas só em casa.
Apesar
 de tudo, nunca deixei a escola. Estudei filosofia na universidade e 
continuo, até hoje, a estudar. Preciso da escola para me disciplinar na 
investigação, para cumprir objectivos. Além disso, trabalho em escolas. 
Trabalho
 na área da filosofia para crianças e é com muito gosto que levo a 
filosofia para dentro do jardim de infância ou das salas do 1º ciclo. O 
gosto é ainda maior quando são os educadores de infância e até mesmo os 
pais que solicitam a minha intervenção. 
É
 maravilhoso ver os mais pequenos a descobrir as maravilhas do pensar, o
 lado lúdico das ideias e o espanto - aquilo que é tão próprio dos 
filósofos.
O
 que não é tão maravilhoso é ver como as escolas precisam tanto de mudar
 o seu olhar sobre a criança. Há muitos anos que se fala em mudança, em 
assertividade, em inteligência emocional, em criatividade, em "mais 
atenção à criança e às suas necessidades", em escolas inclusivas e 
outras coisas que tais. Mas o facto é que ainda há escolas onde o acesso
 ao 1º andar só acontece através de umas escadas horríveis. O facto é 
que há escolas construídas com uma acústica péssima que torna impossível
 ter uma aula com a porta aberta. Há escolas onde as cadeiras são tão 
desconfortáveis que nem percebo como é possível estar sentado ali 
durante mais do que uma hora. As salas continuam com a configuração 
habitual: filas de mesas e cadeiras. E só vemos as nucas uns dos outros.
 E o rosto? Trabalha-se para o aluno médio e ficam de fora os alunos que
 "o sistema" identifica como lentos ou demasiado espertos. Depois há as 
concepções de "portar bem" e "portar mal" - que tantas vezes são medidas
 de acordo com a capacidade que o aluno tem em ficar ou não calado e 
quieto. 
Temos
 um professor ou educador para vinte e oito alunos - o que é violento, 
para ambas as partes. Há escolas com quatrocentos alunos e quatro 
assistentes operacionais para toda a escola. 
Isto acontece agora, enquanto eu escrevo estas palavras. 
Por
 tudo isto - e algumas coisas mais - fico muito emocionada quando vejo 
 pais, educadores, professores e assistentes operacionais a "fazer 
magia" com os recursos que têm. E ainda se consegue fazer magia. É 
esgotante, é um constante lutar contra a maré. Mas consegue-se.
Trabalhar
 por uma escola diferente significa olhar para os exemplos que nos 
chegam de fora - e de dentro. Escola da Ponte, Casa da Árvore (em 
Leiria) ou o agrupamento de escolas gerido pelo professor Adelino 
Calado. Temos exemplos que nos mostram que é possível pensar, desejar e 
fazer acontecer uma escola diferente, mais ajustada às crianças dos dias
 de hoje, às necessidades de aprendizagem diversificadas que cada um 
apresenta. É possível o verdadeiro trabalho interdisciplinar: 
psicólogos, professores, educadores, pais, família, profissionais do ATL
 (actividades de tempos livres) ou das AEC (actividades 
extra-curriculares / de enriquecimento curricular). 
E
 se é possível, só temos que "contaminar" os locais por onde passamos. 
Cada um de nós. Fazer a diferença na vida das crianças com quem 
trabalhos.
Há
 uns anos trabalhei numa escola do 1º ciclo, como técnica de AEC. Era 
conhecida pela "professora que não gostava de ser tratada como 
professora". Cedo comecei a perceber que os alunos não sabiam os nome 
dos professores, com excepção do professor titular. No final do ano, 
quando perguntavam a um dos alunos quem tinham sido os seus professores,
 o pequeno Manuel (nome fictício) , do alto dos seus 7 anos, respondeu: 
"Era a professora Andreia [nome fictício para a professora titular], a 
teacher [professora de inglês], a professora de expressões, o professor 
de educação física e a Joana." 
É
 fundamental não perder a esperança e não baixar os braços. No meu caso 
específico, há que persistir neste trabalho que consiste em alimentar o 
pensamento crítico e criativo da criançada com quem tenho o privilégio 
de me sentar para filosofar. Para mim, a filosofia deverá estar nas 
escolas desde cedo. Desde os 3 anos, no jardim de infância. O trabalho 
do filósofo tem que ter uma componente pedagógica relevante e deverá ser
 realizado em equipa com os educadores e professores de cada turma, de 
cada aluno. Se isso sempre acontece? Não. Tenho tido a felicidade de 
trabalhar em parceria com educadores e professores interessados - e 
outros que nem por isso. Foco-me no trabalho com os primeiros e tento 
fazer o melhor possível com estes últimos.
Todos
 os dias trabalho por uma escola diferente, com filosofia e gosto pelo 
pensar. Por falar nisso, tenho algumas aulas para planear. E um jogo que
 prometi a uma turma, em que pudéssemos brincar ao "whatsapp" e usar a 
filosofia. Meti-me em trabalhos, está visto. Mas daqueles trabalhos 
bons, em que sou chamada a pensar e a criar. Porquê? Por que os meus 
alunos me desafiam, todos os dias. 
Boa tarde.
ResponderEliminarNão compreendo a escola actual.. Tenho 36 anos e já quando fui aluna não compreendia a escola.. Tenho agora um filho de 6 anos.. Das primeiras coisas que disse à professora do meu filho (que entrou este ano para a primeira classe) foi não concordo com os trabalhos de casa. A primeira vez que ela os mandou para casa, ele não os fez e levou um vermelho no comportamento (dos TPC) todos os dias até os ter feito. Agora ele quer sempre fazer os tpc e mais quer fazer os tpc extra porque assim tem um azul no comportamento, se levar só os tpc normais tem um verde. É um descanso para mim o meu filho estar a reagir bem à escola e a querer esforçar-se mais, fazendo isso com vontade e capacidade - que sei que tem.
Mas como mãe consciente, que faço questão de ser, assusta-me as consequências que terá para ele no futuro estar horas e horas e horas todos os dias sentado a uma secretária...
Mas do fundo do meu coração partilho aqui, que não faço ideia de como fazer diferente...